sexta-feira, 20 de março de 2009

Mais historiadores da Marambaîa

A postagem do último dia 16 - em que contei um pouco da história da Marambaia, através das vivências de Seu Mário - tem provocado momentos de pura nostalgia em dois visitantes ilustres deste blog.
O Yúdice Andrade, por meio de seu Arbítrio, lançou um projeto de resgate da memória deste glorioso bairro, "mesmo sem qualquer previsão de prazo, já que esse diletantismo terá que ficar para as réstias de tempo que tiver, sem qualquer prioridade". Além disso, revirando seus arquivos mentais, ressuscitou o caso das pedras misteriosas que caíam nas casas.
O Intimorato Frederico Guerreiro, "apertou os dedos no teclado como quem descarrega um fuzil AR-15" em dois comentários enriquecedores e esclarecedores, impregnados de reminiscências pessoais, nos quais são levantados mais aspectos históricos deste "bairro de personalidade", como declarou o Flanar Scylla Lage Neto.
Todos esses retalhos histórico-literários não mereciam ficar relegados a uma reles caixa de comentários. Por isso, foram convertidos nesta postagem, exatamente como foram escritos por seus autores.
Esperamos receber mais contribuições, no sentido de construir esse mosaico, a várias mãos, e assim deixar para as futuras gerações um registro da história da Marambaia, através do relato de pessoas que a testemunharam. (Um dia este blog vai ser importante... eu sei!)
Sem pressa... Sem pressões... Por pura curtição!

Mano, vai ser difícil. Mas posso tentar conversar com uma ou outra pessoa. Minha família foi uma das primeiras a se mudar para o Médici, em 1971, mas confesso que jamais perguntei sobre a vida, na época. Do passado do bairro só conheço, um pouco, sobre o caso das pedras misteriosas que caíam nas casas, no entorno do Bosquinho.
Taí, eu topo estudar a história do Marambaia, como legítimo morador que sou. Acho que podemos contar também com o Fred Guerreiro, se ele tiver tempo.
(Yúdice Andrade)

Yúdice, a história das pedras nos telhados foram em frente ao cemitério (não no bosquinho), lá pelo final dos anos setenta. Tudo não passou de um doente mental que jogava pedras com uma baladeira do cemitério, para chamar a atenção. Descobriu-se depois que ele morava na casa apedrejada e queria promover um sensacionalismo para a família ficar famosa na nascente TV Liberal. Foi o que se falou na época.
Pelo que ouvi da minha avó, o Conjunto Médici I teve sua construção concluída em 1972, pelo menos é o que consta no contrato de compra e venda com a Socilar, que, posteriormente, teve os créditos comprados pela CEF. Compramos duas casas por aqui. Uma é a que eu moro.
O nome do conjunto foi dado em homenagem que dispensa aos senhores apresentação. Realmente, como bem disse o texto do Belenâmbulo, aqui era como se fosse um interior, justamente pela distância e falta de infraestrutura de transporte e comércio. A feira era tudo que havia. O final da linha do lotação a que se referiu o Belenâmbulo ficava realmente no cruzamento da Rua da Mata com a Santarém, naquela época só lama e mato, pois o Médici II ainda estava em construção.
Lembro-me ainda da construção do Colégio Integrado, onde cheguei a tomar banho na caixa d'água de concreto, próximo de onde é hoje a Escola Eleonora. O exército costumava fazer operações pelo conjunto, pousavam inclusive helicópteros na Rua Santarém. Adorávamos ficar olhando. Eu era criança na época, mas aos poucos, entre idas e vindas do Rio de Janeiro e de Batista Campos, onde moramos a maior parte do tempo na época (hoje é maior o tempo que estamos aqui), fui conhecendo o bairro.
A história do igarapé (São Joaquim) é verdade. Íamos a pé por dentro das matas da marinha. Porém, pouco tempo depois foi fechado o acesso e passamos a ir ao igarapé por um caminho no final da Rua da Marinha, lá no fim do Médici II. Áquela época, a água era limpíssima, inclusive pegávamos peixes ornamentais por lá, usando mosquiteiros. Certa vez eu e meu primo fomos até embaixo da ponte da Marinha, por dentro do igarapé, pegando peixinhos, e tivemos de nos esconder quando uma sentinela passou. Ficamos quietinhos para não sermos vistos e acabarmos lavando os alojamentos do quartel, como já havia acontecido com alguns colegas da rua (lembrem-se: era regime militar). Minutos depois de o guarda sumir na estradinha, nossos corpos estavam com algumas sanguessugas pregadas. Ficamos apavorados. Corremos para casa e minha tia retirou as sanguessugas com sal.
Já em relação à entrada da Marinha, havia também o final da linha do Tavares Bastos. Ainda não havia Rua da Marinha para o lado direito de quem vem da Rodolfo Chermont (àquela época ainda Av. Tavares Bastos). Era só mato e lama.
No mais, ouvi dizer que Marambaia, na língua tupi, significa esconderijo cercado de água, talvez pela quantidade de igarapés que havia por aqui há muitos anos, pela dificuldade de acesso quando a região começou a ser ocupada.
Enfim, há muitas histórias para contar. À medida em que for me lembrando delas, eu conto.
No mais, 40 anos é um pouco exagerado. Acho que não havia era nada por aqui.
Ah, o s. Mário pode ser simpático. Mas não deve ser muito saudável comer aquele lanche rechado de poeira que os carros levantam naquela esquina, bem na parada do ônibus. Se sentir uma sensação de estar comendo terra, é isso, tá explicado, não se espante, não corra, não mate, não morra.
Afinal, como dizem, se o que não mata engorda...
Abraço a todos
(Frederico Guerreiro)

Alguém aí lembra do japonês dos peixinhos?
Ali onde estão sendo construídas duas torres da Arteplan (?) ficava o japonês que, com sua família, vendia peixes ornamentais. Tinha de todo tipo. Até poraquê e piranha. Bem ao lado, onde hoje é um canal de esgoto, ficava um igarapé que abastecia de água e peixes os tanques naturais do japonês. Na época, havia apenas uma ponte pequena de madeira, logo depois foi construída uma de concreto, por volta de 1975, quando já habitado o conjunto Mécici. Sequer havia a caixa d'água da COSANPA (hoje desativadas as duas). Quando caía um daqueles temporais, pegávamos nossas bicicletas e corríamos para lá para pegar os peixinhos que fugiam por causa do transbordamento dos tanques do japonês.
Pois bem. E o que nos trouxe o tal desenvolvimento? O que era um igarapé, que deveria ter sido preservado para, em meus sonhos, transformar Belém em uma Veneza amazônica, se transformou em um valão de esgoto a céu aberto. Ali onde está a COSANPA era um pequeno bosquinho onde podíamos nos deliciar com árvores das mais variadas frutas, entre elas mangueiras, jambeiros e jaqueiras, estas as quais sequer se vê mais pela cidade. Pelaram de verde a nossa Belém. Desvirtuando um pouco do assunto, um exemplo é a minha casa, a única do quarteirão que tem uma mangueira, um limoeiro, uma aceroleira e uma caramboleira no quintal. Os açaizeiros tive de cortar no final do mês janeiro, pois, embora me dessem o sabor de colher minha própria sobremesa do almoço de domingo, ameaçava desabar de tão alto, em cima dos telhados meu e de meu vizinho.
A Marambaia ainda é um bom bairro para se morrar. Foi esquecido durante décadas por governos incompetentes, que somente poucos anos atrás nos aquinhoaram com asfalto, o maior anseio de quem vive por aqui e já estava cansado de sujar a bainha da calça toda vez que chovia. Era muita lama.
O transporte público ainda é o mesmo (ruim), apesar do crescimento exponencial da população do bairro. Hoje, ainda não temos bons restaurantes ou agencia bancária. Porém, já podemos dizer que somos "gente boa".
Enfim, guardo boas lembranças de minha tenra idade vivida no bairro. As histórias são muitas. Delas me lembro só de olhar o meu aquário vazio, encostado no meio do monte de tralhas que acumulamos na vida. Mas isso é outra história que contarei, se conseguir terminar o ensaio que venho escrevendo sobre "O Efeito Retardado" (efeito que vida de dificuldades causa em um jovem inconsequente). Por isso retardado, coisa que espero deixar de ser algum dia.
Quem sabe um dia termino de contar a minha e outras histórias?

Alguém aí se lembra da Palhoça, aquela casa da luz vermelha que ficava onde é a madeireira em frente à Yamada?
(Frederico Guerreiro)

5 comentários:

Yúdice Andrade disse...

Resposta ao Fred:
1. O Dicionário Houaiss apresenta um sentido à palavra "restinga" tratado como regionalismo daqui do Pará. Ei-lo: "faixa de mato às margens de um rio, a qual aflora por ocasião das cheias, ficando o terreno submerso". Com isso, penso que a tradução "restinga", que mencionei lá no Arbítrio pode fazer sentido.
2. Sobre o caso das pedras nos telhados, o Walcy Monteiro, em um dos volumes daquele delicioso "Visagens e assombrações de Belém", conta uma versão mais interessante e ampla do caso e foi com base nela que me manifestei.
3. Sobre a construção do Médici I ter terminado no ano de 1972, posso afirmar que minha família se mudou para lá quando meu irmão tinha um ano de idade, o que ele completou em setembro de 1971. Acredito, por isso, que as obras tenham terminado um pouco antes de 1972.
4. Tenho documentos de quando meu pai comprou o imóvel da família, em regime de financiamento, de uma cooperativa chamada COOHATUBE. Essa cooperativa acabou e foi substituída pela Socilar. Quando eu achar esse documento, publicarei algo sobre ele, a fim de dar um passo no nosso "Projeto Memória da Marambaîa".
5. Lembro-me de japonês, sim. Chamávamos ao local de "floricultura", porque ali também funcionava uma, mas eu e meu irmão, que adorava criar peixes, íamos lá por causa dos peixinhos ornamentais, mesmo. Lembro-me do poraquê e das piranhas. Vi muitos peixes incomuns por ali. Era divertido. Fazíamos o trajeto de ida e volta a pé. Na volta, levávamos um saquinho com os peixes e comida. Vitormônio ou algo assim.
Foi nessa época que aprendi a não bater no vidro dos aquários (para não afetar o coração dos peixes) e a colocar o saco inteiro no aquário de casa, abrindo-o somente depois de alguns minutos, para evitar choque térmico.

Frederico Guerreiro disse...

Taí, dessas eu não sabia.
Vou ver se busco mais informações para resgatar a memória da nossa Marambaia.
Valeu, Yúdice!

Anônimo disse...

Prezado Yúdice, valeu por mais essa! E valeu também pelo lançamento solene do Projeto Memória da Marambaîa no seu blog.

Prezado Frederico,
Também pretendo conversar com algumas pessoas e, no dia bissexto em que tiver uma folguinha de manhã, dar uma passada na CODEM.

Infelizmente a ideia continua restrita a "três doidos nostálgicos", mas vai melhorar, eu sei.

Abraços

Ronald disse...

Também tenho algumas "boas" lembranças da velha Maramba. Lembro que no trajeto para a escola, eu saia quase com uma hora de antecedência para "frestar" desenhos pelas casas de palafita do trajeto para a escola, já que na época não tinhamos tv.
Era início dos anos 80, mas lembro ainda do terminal da Tavares Bastos, Rua da Mata, Colégios Duque de Caxias, Cornélio de Barros e Almirante Tamandaré, etc...Já no entrocamento propriamente dito tenho mais lembrança.

Belenâmbulo disse...

Prezado Ronald,
Agradeço pela visita e pelo comentário.
Foi ótimo você ter ressuscitado a memória da Marambaîa. Estou mesmo precisando publicar mais histórias por aqui.

Abraço